terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Sonegação tributária

A sonegação tributária merece uma análise cuidadosa, considerando, principalmente, uma relação histórica entre o Estado e a Sociedade, sabendo-se que o próprio Estado nunca vacilou em alimentar a imagem de gestor de uma desmedida obstinação arrecadatória.
Qualquer cidadão mais bem informado e crítico, sabe que a arrecadação de tributos é necessária, para que, capitalizado, o Estado possa fazer frente às necessidades estatais (públicas), incluindo, obviamente, o custeio das despesas oriundas dos mais diversos serviços públicos.
Mas, eis aí a concepção original do que se conhece como uma constante "queda de braço" entre o cidadão e o Estado; o primeiro, vendo-se como vítima espoliada do segundo, que, por sua vez, se vê prejudicado pelo primeiro, que se recusa à sua cota-parte no rateio das despesas públicas. Nesse enquadramento, não se pode recusar razão a qualquer das partes. Resta, então, avaliar a evolução histórica da relação e os fundamentos para a manutenção do embate.
A verdade é que, historicamente, a relação Estado/sociedade sempre foi vista como uma relação conflituosa, de exploração da segunda pelo primeiro. Desde a fase colonial, o Estado praticamente abandonava a sociedade à própria sorte, que, mesmo assim, era obrigada a alimentar os cobiçosos cofres públicos. Já na época colonial, a fúria fiscal do Estado obrigava os cidadãos a se defenderem, preservando as modestas "riquezas" obtidas com o trabalho árduo a que se emprenhavam. A resistência contributiva, então, era vista como uma conduta legítima frente à postura invasiva do Poder Público, que só almejava o enriquecimento da Coroa, que significava, na realidade, maior ostentação e conforto para os afilhados do Poder. A Coroa (Estado) reagia, investindo furiosamente contra os recalcitrantes. O cidadão devia os impostos e não tinha direito a nada... Então, quanto maior o arbítrio, mais legítima era vista a sonegação; que o digam os mártires da Inconfidência Mineira... Destarte, numa primeira fase histórica, consolidou-se, no Brasil, a percepção de que a sonegação se constituía num ato legítimo contra a cupidez fiscal do Estado.
O tempo passou, etapas históricas se cumpriram, e hoje, o Estado parece não gozar de maior prestígio junto ao cidadão contribuinte. Atos de corrupção dos mais variados matizes e para todos os gostos, incompetência gerencial, inoperância estatal, abandono de serviços fundamentais para a sociedade e inadimplência estatal (vide o caso dos precatórios, na prática, a sonegação do que é devido ao demandante judicialmente declarado credor), são ingredientes eficazes para uma resistência talvez até mesmo maior que a demonstrada no período colonial. Ademais, o cidadão brasileiro convive, diuturnamente, com os mais sonoros e múltiplos escândalos de toda ordem, que, invariavelmente, culminam na incolumidade daqueles que, num primeiro momento, se viram envolvidos e acusados do protagonismo ilícito. A notória "pizzaria brasil"...
O internauta deve se perguntar: qual a alternativa para solucionar tão aflitivo confronto? Invariavelmente, a resposta aninha-se na eliminação das razões que alimentam o relatado estado de tensão. Só o Poder Público assumindo suas obrigações institucionais (incluindo o efetivo combate às práticas criminosas de toda ordem, incluindo, naturalmente, aqueles protagonizadas por agentes públicos), prestando serviços públicos decentes (saúde, educação, segurança pública, transportes, infra-estrutura, ...) e gerenciando competente e honestamente os recursos do Erário, para que, assim, possa conquistar a confiança da sociedade, que, então, seguramente, não se recusará a concorrer para as necessidades públicas. Afinal, a sociedade brasileira é desconcertantemente generosa e, decerto, não se furtará ao concurso de recursos ao fundo social comum, desde que, esse fundo seja, realmente, social. As recentes grandes catástrofes (Santa Catarina, Haiti, ...) são exemplos retumbantes da generosidade do povo brasileiro!... Aliás, povo "generoso" até mesmo para com alguns maus políticos...

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