quarta-feira, 28 de abril de 2010

Impedimentos da magistratura

Principalmente, a fim de garantir a imparcialidade de magistrados, a Constituição da República elenca os impedimentos a que devem se submeter todos os componentes do Poder Judiciário. Então, a "imparcialidade" representa uma garantia aos próprios juridicionados (cidadãos), que, assim, podem esperar uma atuação isenta daqueles que são investidos do poder de ditar as decisões judiciais.
Com efeito, o parágrafo único do artigo 93, da vigente Lei Maior dispõe:
"Art. 93 (...)
Parágrafo único. Aos juízes é vedado:
I - exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de magistério;
II - receber. a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo;
III - dedicar-se à atividade político-partidária;
IV - receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei;
V - exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por aponsentadoria ou exoneração."
Pois bem, recentemente, foi amplamente divulgado que o Min. Gilmar Mendes (STF) seria sócio-proprietário de uma prestigiosa entidade de ensino jurídico em Brasília. O caso mereceria uma criteriosa apuração, notadamente pelo Ministério Público - destacando-se que aqui não se faz acusação alguma -, a fim de, quando menos, isentar-se o douto Ministro do Supremo Tribunal Federal de qualquer tipo de insinuação ou suspeita indevidas. A atuação jurisdicional, sobretudo na instância suprema, não pode restar exposta ao mais mínimo questionamento. Afinal, a prestação jurisdicional comporta relevantíssimo interesse público!
Ademais, a simples cogitação referida, deveria despertar a mais profunda investigação e a mais veemente reação dos Poderes Públicos!
Enfim, é importante enfatizar, MAIS DO QUE IMUNE AOS QUESTIONAMENTOS LEGAIS, A MAGISTRATURA DEVE RESTAR ÍNTEGRA A QUALQUER CONSIDERAÇÃO DE ORDEM MORAL...
Todavia, mais uma vez, no encerramento desta sucinta reflexão, fica a advertência de que não se faz acusação (nem insinuação) alguma, mas apenas um comentário, a fim de, talvez, provocar, por parte do Poder Público, a devida e minuciosa apuração e esclarecimento de toda a situação. Até no interesse do próprio Ministro Gilmar Mendes, creio eu, o maior interessado em ver sua integridade preservada... E o prestígio do Poder Judiciário também merece incontido respeito, até para a preservação da ordem no Estado Democrático de Direito.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Assédio social?

No dicionário Houaiss temos a seguinte definição para o significado do termo "assédio": "insistência impertinente, perseguição, sugestão ou pretensão constantes em relação a alguém". Pois bem, a partir da definição transcrita, correntes jurídicas adotaram o termo para conceituar importantes institutos já amplamente acolhidos nos meios forenses. Assim, a evolução social que condiciona os conceitos e institutos jurídicos, resultou significativa a ponto de impor a cunhagem dos novos institutos do "assédio sexual" e, mais recentemente, do "assédio moral".
Todos, de forma geral, já admitem o vigor dos institutos do "assédio sexual" e do "assédio moral" em nossa realidade cotidiana. Entretanto, vale uma pequena definição:
Segundo a definição legal imposta no artigo 216-A, que criminaliza a conduta, "assédio sexual" é: "constranger alguém com intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente de sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função". Duas figuras são, portanto, centrais na redação do "tipo legal", o contrangimento de alguém com a finalidade de obtenção de favores sexuais; e a condição pessoal do agente, sendo superior hierárquico da vítima (o que implica em serem eles colegas de trabalho) ou gozar de ascendência inerente ao seu status profissional (também remetendo ao ambiente profissional comum).
Sem previsão legal específica, o conceito de "assédio moral" adveio de construção pretoriana (jurisprudência), sendo comumente admitido, como "conduta tendente a transformar a vítima em um robô, como proibição de sorrir, conversar, levantar a cabeça, cumprimentar os colegas de trabalho etc." (Luiz Flávio Gomes). Tanto quanto o primeiro, esta, também, justifica determinadas punições judiciais.
Com efeito, já amplamente divulgados e aceitos, os referidos institutos refletem a evolução característica das sociedades modernas.
Todavia, deparamo-nos, cotidianamente, com as mais constragedoras demonstrações de marginalização social. São "pessoas" completamente alijadas dos serviços disponibilizados pelo progresso de uma sociedade moderna, às vezes, até mesmo, do suprimento às mais elementares necessidades animais, como alimentação, moradia e higiene. Tudo não se mencionando o mais revoltante desemparo estatal àqueles que talvez sejam vistos como um "entrave" à convivência social, numa postura repugnante aos que vislumbram "algo mais" no ser humano.
A desassistência estatal aos excluídos traduz-se num campo fértil às milímodas manifestações de revolta individual, algumas vezes descambando para variados desvios comportamentamentais, não raro definidos como atos de considerável gravidade social, como crimes de toda ordem.
Não seria o caso de se conceber, na acintosa marginalização dos excluídos, uma nova face do "assédio", agora conceituado como "assédio social"? Ou a irresponsabilidade de governantes (incluindo-se a corrupção) pode continuar determinando as mais variadas distorções sociais, com impacto imediato e definitivo sobre a nossa própria realidade?
Fica a sugestão para que jurisconsultos idealistas possam refletir a respeito, posto que, decerto, seu ativismo técnico poderá auxiliar no aprimoramento de nossas instituições jurídicas e sociais. Afinal, devemos pensar o mundo para os nossos filhos...

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Têmis ou Nêmesis?

Afinal, qual o signo aspirar para a Justiça (com letra maiúscula, remete ao Poder Judiciário), Têmis ou Nêmesis? Primeiro, é necessário definir o significado do que, no momento, tem-se, apenas, por expressões.
Na mitologia grega, Têmis e Nêmesis são os nomes de duas deusas. No Brasil, o Poder Judiciário é simbolicamente representado pela imagem de Têmis, todavia, nas mais diversas oportunidades, as ações populares denotam a expressiva intervenção de Nêmesis.
Assim, "Têmis" representa estabilidade e solidez, sintetizando a sabedoria que imprime segurança às decisões, conhecida, portanto, como "deusa da justiça". Observa-se que os "ensinamentos" de Têmis não adviriam da consciência coletiva, mas, ao contrário, do inconsciente coletivo, na medida em que a própria natureza humana absorve os requisitos fundamentais para a consolidação da justiça que ela promove. A sabedoria, qualidade imprescindível a quem exerce o ofício de julgar, jamais pode prescindir do equilíbrio, representado na balança que Têmis traz nos braços. Por outro lado, ao julgar não há como ignorar a aplicação da força, a fim de que as decisões possam se impor, sem que necessariamente impostas sejam. Assim, juntamente com o equilíbrio, representado pela balança e a força, assinalada no signo da espada, conferem à nossa deusa Têmis os elementos definitivos para a solução dos mais variados conflitos sociais. Eis, portanto, a síntese de justiça: força e equilíbrio, sem que esta ordem seja necessariamente observada, pois, ao julgar, primeiro, deve-se examinar os fatos com independência e equilíbrio, e só depois de uma avaliação criteriosa, então, sim, proferir a decisão, impondo até mesmo pela força, se necessário, os termos julgamento proferido. "Julgar", no caso, jamais pode ser sinônimo de "justiçar".
Ainda numa concepção mitológica, "Nêmesis", embora irmã de "Têmis", tornou-se a "deusa da vingança", representando a força ríspida e implacável. Então, para Nêmesis, a punição é a definição de justiça. Destarte, o rigor da decisão empalidece o equilíbrio do julgamento. Assim, a punição resume o sentimento de justiça, alijando o equilíbrio que deve orientar o julgamento.
Diante desses esclarecimentos, agora podemos observar o comportamento que a população adota frente a determinados desvios sociais, crimes que desorientam a estabilidade que deve caracterizar a convivência coletiva, assumindo repercussão expressiva na consciência comum, exigindo, no caso, a reação definida por uma severidade equivalente (às vezes, até maior) à intensidade do abalo social. E nesse momento, a percepção coletiva do senso de justiça move-se para o pantanoso ambiente da vingança, numa atmosfera privada de qualquer equilíbrio ou racionalidade. E assim, ao julgar (e, principalmente, punir), pode-se ter, na realidade, justiçar, resultando numa forma de retribuição segundo a mesma orientação dirigida à prática do ato criminoso; é a equiparação do julgador ao infrator (criminoso), subvertendo a ordem, para que o primeiro se rabaixe à ambiência do segundo.
Cabe, portanto, a cada um, examinar a própria postura frente aos desvios sociais, reconhecendo em Têmis, ou em Nêmesis, a síntese do sentimento de justiça. Julgar não implica na necessária punição, mas "justiçar", sim, pois neste, o elemento "vingança" afasta o equilíbrio (balança) também representado em Têmis. Sintetizando, "julgar" ou "justiçar"?