quarta-feira, 10 de março de 2010

Os advogados e a lei 9099/95

A Lei 9.099/95 foi concebida para acelerar o processamento de demandas envolvendo interesses cíveis e criminais, possibilitando a todos um acesso mais barato e rápido à prestação jurisdicional. No primeiro caso, simplificando, a competência é apurada em razão do valor econômico dos interesses confrontados; no segundo caso, são apuradas e punidas as denominadas "infrações de menor potencial ofensivo".
A exposição em questão se concentrará, sobretudo, em demandas de conteúdo cível, afastando, por ora, qualquer consideração relativa à condução de processos criminais.
Decerto, quer-se crer assim, inspirado pelos mais bem-intencionados sentimentos, o legislador buscou regulamentar uma via processual que pavimentasse o acesso do cidadão à solução legal e justa para seus pequenos e variados problemas cotidianos. Entretanto, no afã de oferecer solução a milímodos problemas, o legislador desmereceu a atividade dos advogados, como que a reduzir sua participação profissional a um requinte reservado às demandas envolvendo interesses materialmente mais "expressivos". Como se o pobre, mais uma vez, pudesse ser desassistido por profissionais cuja atividade a própria Constituição reconhece relevante importância. A propósito, é conveniente lembrar que a Lei Maior consigna em seu artigo 133: "O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei" (negritamos).
Então, o pobre, o humilde, o desafortunado, que já carece de acompanhamento e assistência de médicos, engenheiros, dentistas, psicólogos e economistas, dentre outros tantos profissionais, seria, então, também ignorado (mais uma vez?) pelo próprio legislador, que lhe retiraria, então, a assistência dos advogados. Pois foi exatamente o que o legislador fez ao estabelecer no artigo 9 da Lei 9.099/95, a sugestão da desnecessidade da intervenção do advogado "nas causas de valor até vinte salários mínimos" (mas, mantendo a exigência de sua necessária participação quando os interesses debatidos sobrelevassem o patamar legal dos vinte salários mínimos). Assim, a um só tempo, o legislador "insinuou": (a) as causas cujos interesses envolvidos não superassem o limite econômico mínimo estatuído na lei 9099/95 (vinte salários mínimos), permitiriam a dispensa da qualquer acompanhamento da figura do defensor (que a Constituição tão solenemente respeitou) - como se a magnitude material pudesse superar a importância de uma decisão justa - e; (b) a partir da promulgação da lei em referência, o cidadão poderia prescindir da intervenção profissional de um advogado, levando inúmeras pessoas a verem, em sua participação, um entrave ou um acessório plenamente dispensável. Obviamente, ao que parece, a "sugestão" legal foi acolhida sob o enganoso argumento da economia financeira para o demandante, pois é grande o número dos que recorrem aos Juizados Especiais sem qualquer acompanhamento profissional. Parvo engano...
A verdade é tão simples quanto contundente: a participação do advogado é sempre necessária, independentemente da dimensão dos interesses envolvidos (se o contrário fosse verdadeiro, os advogados deveriam ser afastados, também, dos demais processos, independentemente de sua magnitude material) e o argumento da economia para o demandante, oculta o preconceito arraigado de que interesse de pobre pode ser negligenciado...
Aqui está, pois, o grande objetivo deste modesto ensaio: advertir o cidadão para a importância do direito que cada um possa argüir, independentemente de sua expressão material, ou seja, direito é direito, e tem que se defendido por quem seja habilitado para tanto, no caso, o advogado.
Todavia, o leitor deve estar refletindo: "tudo não passa de uma defesa de interesses profissionais". Não é! Quando certas atividades são desprezadas, são igualmente desprezados os interesses delas dependentes ou com elas relacionados. Penso que não preciso explicar mais, entretanto, como a "suspeita" persiste, que busquem avaliar a formação técnico-profissional de um advogado.
Mas, admitindo a necessidade da orientação, intervenção e acompanhamento do advogado, quem remuneraria o aludido profissional? Chegamos onde o legislador deveria ter chegado...
Pretendendo (como se imagina que pretendeu) garantir os interesses dos cidadãos, bastaria ao legislador estipular regra que impusesse a assistência de advogado (qualquer que fosse o valor dos interesses envolvidos na demanda), dispondo sobre a remuneração do aludido profissional, balizando-se, para tanto, por exemplo, na tabela de honorários advocatícios produzida pela Ordem dos Advogados do Brasil, com a previsão de que seu pagamento seria imposto à parte sucumbente (a que foi vencida na demanda). Independentemente do valor do objeto da lide!
Assim, na hipótese de um cidadão, maliciosamente, emitir um cheque no valor de R$ 100,00, repassando-o ao modesto e crédulo lojista, sua posterior devolução, por "insuficiência de fundos", poderia acarretar-lhe a condenação ao pagamento do cheque frustrado, ACRESCIDO do valor dos honorários advocatícios estipulados na tabela da Ordem dos Advogados do Brasil (exemplo: R$ 1.000,00). No caso, o "malandro" seria obrigado a cumprir sua obrigação (frustrada por dolo ou culpa) e, ainda, responderia por pesada condenação ao pagamento do trabalho desempenhado pelo advogado em defesa da parte inicialmente lesada (sua adversária).
E no caso abordado, a vítima, além de se ver ressarcida, teria a garantia da assistência de um profissional legal e tecnicamente habilitado a lhe prestar o melhor serviço, sem que, para isso, concorresse com um único centavo!... Como é hoje, considerando o exemplo suscitado, além de prejudicada com o cheque devolvido, a vítima terá apenas uma das três opções: (I) assume o prejuízo e renuncia a qualquer atuação processual, abdicando da demanda (a mais observada pela maioria das pessoas prejudicados, seguramente); (II) contrata um advogado (gasta dinheiro = prejuízo financeiro) e processa o inadimplente, o que o valor postulado (no exemplo, R$ 100,00) desaconselha inteiramente (o valor dos honorários, certamente, superaria, e muito, o valor do benefício previsto na hipótese do incerto êxito da demanda) e; (III) ignora a necessidade de um advogado e se aventura, diretamente, perante os Juizados Especiais (Lei 9099/95), expondo-se à possibilidade de duplo prejuízo (o primeiro, deixando de receber o valor estampado no cheque e o segundo, ao ver um processo ser conduzido à inteira revelia de um profissional tecnicamente habilitado, o que poderia culminar em outras adversidades - perda da demanda, extinção do processo por alguma irregularidade, dentre muitas outras possibilidades)... É assim, até quando se imagina que o legislador pensou no "pobre", descobre-se que pensou em "como se livrar do pobre"... É a velha prática: "jogar para a torcida"... Só nos resta nos informar e nos posicionar... Mais uma eleição se aproxima!... É nossa oportunidade!!!

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